Na visão budista, há uma dimensão divina em todos nós. Essa dimensão divina nos permite fazer ações positivas ou negativas. Sua Santidade Dalai Lama dizia, logo após o ataque às torres de Nova Iorque: “A inteligência que atacou as torres é a mesma inteligência que poderia ter feito ações muito positivas”.
Nós temos essa inteligência e é importante exercê-la de uma forma adequada. Quando exercemos isso de uma forma positiva, geramos felicidade a nós e aos outros seres. Quando agimos de uma forma descuidada, negativa, causamos sofrimento aos outros e a nós mesmos.
Quando as torres foram atingidas, houve um grande
movimento de apoio à nação americana, houve uma maturidade em todas as nações,
no sentido de nós imaginarmos que aspiraríamos efetivamente à construção de uma
cultura de paz. Isso não se deu. Na seqüência nós vimos uma guerra
injustificada, e agora, ao final desses 8 anos, o próprio povo americano
reconhece isso, coisa que os outros povos do planeta já haviam reconhecido. Então,
nós desperdiçamos essa oportunidade de construir uma aliança das nações e das
pessoas pela paz.
Imagino que agora estamos vivendo um novo tempo. É
como se as torres fossem atingidas, mas de uma forma mais profunda. Isso
significa que o pensamento econômico, que nesse momento, é uma ameaça ao
equilíbrio das nações, uma ameaça em vários níveis, deve ser olhado como algo
que precisa se submeter ao pensamento humano. Nós, seres humanos, precisamos nos unirmos, porque o pensamento
econômico não aspira felicidade em si mesmo. Ele se manifesta simplesmente
olhando para números.
Eu tenho tido contato com as organizações do setor
produtivo e também executivo do setor produtivo. Tenho dado palestras a eles,
faço parte de foros de discussão de como introduzir valores humanos dentro das
empresas. A primeira vez que fiz contato com esse setor, pensei: “ Eles são
muito difíceis. São pessoas que só pensam em ganhar dinheiro.” Na verdade, isso
não é assim. Eles são pessoas como vocês, como nós aqui reunidos. Todos eles
aspiram um mundo melhor, todos voltados a isso. Mas como operam dentro de
grande organizações, é como se a lógica das grandes organizações não pudesse
acessar isso. Então a grande pergunta é assim: “ Como eu, operando dentro dessa
organização, posso fazer alguma coisa, nos limites da própria organização?”. O
pensamento budista, quando reflete sobre as organizações, vê que diferentemente
das inteligências dos seres humanos, dos animais, de toda a biosfera; a
inteligência das organizações não tem, em nenhum lugar, a aspiração da
felicidade. Mas nós, seres humanos, aspiramos à felicidade. Não há lugar algum
dentro das organizações para dizermos: “que os seres humanos superem o
sofrimento”. Mas nós, seres humanos, queremos superar o sofrimento.
Esse processo de colocar o pensamento econômico
submetido ao pensamento humano, não é algo tão difícil. Porque as donas de casa
fazem isso, os pais de família fazem isso. Por exemplo, não teria sentido eu
falar a minha filha de 15 anos: “ O
papai e mamãe têm te sustentado há 15 anos. Eu não vou cobrar agora isso de
você, mas eu já tenho todas as notas guardadas. Naturalmente também não vou
cobrar correção monetária. Mas imagino que quando você chegar aos 30 anos, você
vai estar forte e pode começar a pagar o papai e a mamãe, pelo investimento que
fizemos.” Isso é perfeitamente justo. Nós não olhamos isso. Nenhuma
instituição financeira deixaria de cobrar alguma coisa.
Nós, seres
humanos, somos capazes de investir a fundo perdido nos outros seres e por isso
estamos aqui. Cada um de nós
está aqui porque alguém investiu a fundo perdido em nós. Então esse é o
procedimento, onde o pensamento econômico, que utilizamos durante a nossa vida
(porque se não tivéssemos utilizado o pensamento econômico não conseguiríamos
chegar onde estamos), geriu pelo pensamento humano. Eu não sei bem como fazer
isso, mas com certeza esse é o nosso desafio. Com certeza um pai de família não
vai construir uma central nuclear na sua casa, por menor que ela seja, para
aquecer a água do banho, com a certeza de que todas as gerações daquela família
vão ter que lidar com aquele material letal, porque ele tomou banho por curtos
períodos, na sua vida. Simplesmente isso não tem cabimento.
Por outro lado, deveríamos entender que as lógicas de
curto alcance não são interessantes. Quando olhamos o tempo de hoje e
esquecemos das gerações futuras, isso não é interessante. Ao olharmos com a
nossa mente, apenas o espaço geográfico que habitamos, isso também é muito
ruim. Estamos num tempo, em que precisamos olhar a população como um todo do
planeta e também as gerações do futuro. Do mesmo modo, precisamos entender
nossa cultura do passado, precisamos ainda aprender a ouvir o legado da
experiência das tradições de outras culturas. Hoje eu até pensei em me vestir de terno e gravata (em alguns lugares
eu vou assim). Já fui várias vezes à Pontifícia Universidade Católica, em
Porto Alegre, atendendo a convite para abrir eventos grandes e, em respeito à
própria cultura, eu fui de terno de gravata. Hoje eu vim com essa roupa, a
roupa tibetana, que meu mestre vestia, especialmente para simbolizar esse
encontro de culturas.
Eu não venho
aqui para falar do budismo, que o budismo é melhor, nem para dizer que os
tibetanos são melhores. Venho trazendo um pouco desse sabor da cultura tibetana
que se manifesta através do budismo, porque cada religião, cada núcleo humano,
tem a sua riqueza para oferecer à humanidade, a todos os seres. E
essa é a nossa riqueza. Nós não precisamos ficar todos iguais. Porque é
maravilhoso, eu jamais cantaria como o que eu ouvi hoje aqui. Tivemos esse
momento maravilhoso, de música.
Nós todos somos diferentes e isso é muito bonito. Essa
diferença é o que nos faz interessantes uns aos outros. Isso é cultura de paz,
e isso é complementaridade também, que eu aprendi na física quântica. Nossa
capacidade de entender os outros seres no contexto deles, ou a nossa capacidade
de olhar para os outros, procurar entendê-los e aceitá-los, mesmo que não
entendamos. A essência da complementaridade é isso.
Existem muitos mundos que não são redutíveis uns aos
outros. Um dos exemplos disso seria a Medicina: a biologia que estudamos aqui
no Ocidente não consegue entender como as agulhas da acupuntura funcionam. Hoje
a medicina absorve a cultura sem entender o fundamento, propriamente. O
fundamento dos canais, dos ventos, ela não entende propriamente isso. Nós vamos
encontrando variáveis tipos de medicina como a própria medicina da homeopatia,
que também não é compreendida pela biologia convencional.
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